sábado, 29 de novembro de 2008

Saint Michel e laïcité

Pessoal:

Hoje fomos passaer à tarde. Fomos literalmente "bater pernas"... Saímos daqui da Maison por volta de 13h30 e fomos à C&A, pois a Elen, a Gyselle e o Alexandre queriam comprar casacos. Eu também estava pensando em comprar um para a Lígia, porém achei melhor esperar um pouco mais... Quem sabe não pego uma promoção... Daí que, saindo de lá, fomos à Fnac procurar alguns livros, porém a livraria estava insuportável!!!! Muita muita muita muita gente. Desistimos e resolvemos ir à Saint Michel. A idéia inicial era tomarmos sorvete. Mas, no meio do caminho, lembramos que há lá também uma livraria excelente, a Gibert Joseph. Fomos lá e eu encontrei alguns dos livros que procurava. Os outros a pessoa ficou de me encomendar e me enviar um SMS avisando a chegada. A Elen quem ficou doida lá... Ela disse que nunca tinha subido ao 4º andar da livraria, justamente onde ficam também os livros sobre literatura e teatro... Ela ficou com o coração apertado de não ter dinheiro suficiente para comprar muitos outros livros além do que ela pegou....
Saindo de lá, ainda meio sem rumo, decidimos ir a uma casa de galettes. As galettes parecem um pouco com a crepe, porém a massa é um pouco diferente. E, por ser uma tradição do oeste da França, o garçom sempre oferece uma cidra para acompanhamento... Foi muito legal....

Nessa foto, o garçom conseguiu enquadrar todos os quatro aventureiros: eu, Gyselle, Elen e Alexandre. (ficou engraçada a outra garçonete atrás, meio esfumaçada...)
Aqui o casal Elen e Alexandre... Ficaram bonitos na foto, não? Detalhe atrás para uma parte da cozinha...
Aqui, eu e a Gyselle
Essa foto foi tirada no caminho entre a Fnac-Châtelet e o bairro do Saint Michel...
Foi uma tarde bem bacana... Um passeio agradável....
Mas agora eu queria falar sobre outro assunto.... Sobre a laïcité dos franceses... É que ontem me ocorreu algo que me chamou a atenção... A França, assim como o Brasil, é um estado láico, ou seja, a poder político não é também religioso. Porém, aqui na França, esse conceito tem uma conseqüência distinta da do Brasil. No Brasil, a "laicidade" (existe esse nome em português?) é refletida na população por um certo respeito a religião dos outros, no sentido em que cristãos, mulçumanos, judeus etc. vivem juntos e sem guerrear por causa disso (como as guerras civis que ocorrem em, por exemplo). Além disso, o que vemos no Brasil é que, muitas vezes, algumas pessoas têm mais do que uma religião.... Elas podem, por exemplo, serem católicas e freqüentarem o centro espírita... Eu já vi inúmeros casos desses no Brasil.... Isso é uma realidade da população brasileira. Mas, aqui na França, a "laïcité" reflete na população na maneira que ninguém conversa sobre religião em público. Ou, o que ainda é mais estranho ainda para nós, brasileiros, é que as pessoas sentem até vergonha de discutir esse assunto. Vou narrar o que me aconteceu ontem voltando do centro:
Saímos do centro e fomos eu e a Gysele (que não é a mesma da foto acima) ao metrô. Chegando lá, encontramos um sr. francês, que também estava no centro. Fomos juntos até a estação Nation, onde a Gysele pegou uma direção e nós, eu e o sr., nos dirigimos ao RER A. Pois bem. Foi ótimo pois treinei bastante a minha conversação em francês. Ele ficou perguntando se eu já estudara francês antes, se eu estava bem alojado, há quanto tempo eu estava já na França... Enfim, o sr. estava sendo bem simpático e atencioso. Nem estava prestando tanta atenção aos meus erros de francês, que, é lógico, acontecem ainda... Porém, em uma determinada etapa da conversa, eu fui dizer a ele o que eu mais gostava do centro espírita que freqüentamos, em Vincennes. Quando eu pronunciei as palavras "centre espirite", a reação dele foi a das mais estranhas. Ele na hora me fez um "shiiiiiiiu!" e me olhou com uma cara de "não diga isso!!!!".Sem dizer nada ainda, ele olhou para todos os lados, como se procurando ver se alguém tinha ouvido o que disse... Isso porque, por ser bem tarde da noite, perto já de 23h00, não havia muitas pessoas no vagão... Só então ele se , chegando bem de mim e, com uma voz quase-sussurrada, me pediu "s'il vous plaît" que não repetisse de novo essas palavras. Isso porque, segundo ele, simplesmente não se pode dizer isso no metrô!!! Eu, é lógico, até porque o sr. estava sendo muito simpático comigo, pedi desculpas e substitui as palavras "Centro Espírita" no restante da minha conversa por "O lugar onde fomos". Quando fiz isso ele me agradeceu e me disse que agora estava ótimo....
Estranho isso: a laïcité francesa resume-se, na realidade, na não-discussão pública do assunto. É louvável que, aqui, as pessoas respeitem a religião dos outros. Porém certas atitudes, ao nosso modo brasileiro de ser, parecem um pouco excessivas... Não poder nem ao menos dizer de qual religião você é, em público, é uma maneira também de não discutir as diferenças. Daí que, retroativamente, fui percebendo algo: aqui você também não vê, como no Brasil, pessoas que ficam em praças públicas declamando a bíblia, por exemplo. Ou algo do tipo... (não é que eu goste desse pessoal aí do Brasil, mas, de qualquer forma, eles existem.) Aqui o que ocorre é meio um respeito pelo silêncio. Uma maneira bem francesa de encarar as diferenças é, simplesmente, nesse caso, fingir que elas não existem? Creio que não. Pois, também andando pelas ruas, pelo menos uma religião é facilmente identificável.: o muçulmano. Isso pelas vestes, que são inconfundíveis. Mas, é lógico, por respeito, ninguém vai sair dizendo a eles que não podem se vestir assim ou assado... E nem mesmo deveriam fazer isso!... Mas, mesmo nesse caso, parece-me que os franceses simplesmente viram os olhos para outro lado e está tudo bem... Enfim, é o jeito deles... E tem funcionado. Pelo menos não se vê, assim como no Brasil também não, pessoas brigando por causa da religião. E isso é bom... Mas, não discutir é também uma forma de dizer ou que tudo está realmente tudo muito ótimo, ou que já ferrou de vez. Por exemplo, um casal que não discute a relação é, ou porque acabaram de se conhecer (talvez) ou porque algum dos dois já está pensando mesmo em separar e não tem mais jeito. Ou seja, sempre há alguma coisinha para acertar: é assim que funciona a vida; é assim que os humanos funcionam... Porém, dizer que em um país com uma taxa de suícidio altíssima (na sexta mesmo houve mais um "accident voyager" na linha 1 do metrô. É, em média, um ou mais por semana ....), dizer que aqui está tudo bem, aí sim é fugir da realidade.... E, ao mesmo tempo, as pessoas não percebem a importância que tal assunto tem...
Sei lá, acho que já estou divagando demais...
Um grande abraço a todos,
Tadeu

5 comentários:

Elen disse...

Oi Tadeu,
pois é: fui inúmeras vezes à Gibert Joseph, mas parava no 2o. andar. E nunca me toquei que lá ficam os livros "pochet" de literatura... quando vi aquele monte de livro sobre teatro, pirei. Mas lá é pra deixar qualquer um doido, não?!
Obrigada pela companhia no passeio e na galette... e obrigada, aussi, por registrar os momentos.

Elen disse...

pocket...

Tadeu Taffarello disse...

De nada, Elen...
Obrigado você por me acompanhar...
E, com certeza, até a próxima...

Lígia disse...

Tadeu.

creio mais em falsa compreensão e preconceito velado dos franceses do que laïcite.

agora....quer dizer que para mim só o que estive na promoção??? pão duro!

ciao
Te amo.

Tadeu Taffarello disse...

Gata:

O que eu me esqueci de escrever é que eles se comportam aqui como se ter uma religião fosse algo proibido, fora-da-lei...

É algo muito estranho...